21 fevereiro, 2010

Momento musical


...ser "banhista". Serve o seguinte post para opinar sobre a importância dos banhos ou dos "cuidados de higiene e conforto", que tanta é para alguns enfermeiros. Para muitos, o banho é um importante momento para fazer tudo e mais alguma coisa... mas o enfermeiro não está 24 horas com o doente? Para mim há cuidados de higiene susceptíveis de serem executados obrigatoriamente por enfermeiros, há cuidados de higiene susceptíveis de serem supervisionados obrigatoriamente por enfermeiros e há cuidados de higienes susceptíveis de serem executados por qualquer pessoa. A grande maioria dos cuidados de higiene a dependentes são executados por não enfermeiros, mas quando chegam ao hospital passam a ser uma técnica espantosa e espectacularmente diferenciada da enfermagem. Quando um enfermeiro ensina um cuidador informal, ensina a dar banho ou ensina cuidados de higiene e conforto? O cuidador informal passa a ser enfermeiro na arte do banho? Para quem julga que os enfermeiros têm o controlo sobre os cuidados de higiene neste país, como técnica própria de enfermagem, saibam que há fisioterapeutas e outros profissionais da área como terapeutas ocupacionais, formados em geriatria a ensinarem cuidados de higiene (os aspectos mais técnicos como vestir e despir o doente com AVC, os cremes a utilizar, as massagens…). Porque se preocupam tanto que nos possam tirar os preciosos cuidados de higiene e a optimização da fralda? Nem os auxiliares ou assistentes operacionais os querem! Não se preocupam com os injectáveis que já foram para os farmacêuticos, com a reabilitação que já foi para os fisioterapeutas/fisiatras, com as colheitas de sangue que vão para os técnicos, com a enfermagem obstétrica que vai para as doulas, com a emergência pré-hospitalar que vai para os "tais TAE's", com técnicas de enfermagem que os médicos começam a querer usurpar... logo que possamos continuar de esponja na mão a lavar doentes e mudar fraldas, ninguém nos tira a dignidade!  Este assunto faz-me lembrar um tema da "música ligeira portuguesa" (ou "pimba"), mas com uma letra adaptada assim:

Podes ficar com os injectáveis, a EPH e a reabilitação
Mas não fiques com os banhos.
E até as colheitas de sangue, e a entubação,
Mas não fiques com o cocó.
Podes ficar com as grávidas e dizer que eu não presto,
Mas não fiques com o vómito.
Tira-me todas as técnicas, e o mais que consigas,
Mas não fiques com a relação de ajuda holística.

16 fevereiro, 2010

Olha a postura


...saber estar. Durante o tempo de curso, sobretudo em alturas de estágio, fui constantemente atormentado pelo "saber estar... saber ser", pela "postura" e penso que isto seja generalizado no nosso país. Com "postura", referiam-se certamente ao modo como nos comportamos, à nossa conduta durante o trabalho, perante os doentes e os outros profissionais, e já agora, perante os colegas. Na altura achava isto da "postura" um bocado ridículo... e contínuo a achar! Ridículo pela maneira como era abordado pelos nossos professores: "o cabelo tem de estar bem preso, nem um fio de cabelo solto no meio da testa... durante a passagem de turno e nas enfermarias, nada de estar encostado a nada ou com as mãos nos bolsos...". Depois incutiam-nos comportamento perante o doente de "ajuda... carinho... atenção... simpatia... ser prestável", e de maneira mais dissimulada, "servidão, escravidão, submissão e vassalagem" perante o doente, que "tem sempre razão" e "cujos desejos deverão ser as nossas ordens, pois estamos ali para o servir e sempre com um sorriso nos lábios", é a badalada "relação de ajuda" que a mim sempre me meteu alguma confusão, ainda não compreendi se pelo que é ou por aquilo que fazem dela. A verdade é que a "postura" é importante, em qualquer profissão e precisa realmente de ser melhorada nos enfermeiros onde existem muitas falhas que contribuem para uma imagem negativa da profissão. Contra mim falarei, mas quão comum não é os enfermeiros estarem numa enfermaria a discutir assuntos pessoais perante os doentes ou a contarem piadas, entre si ou com os doentes e já agora, na presença de outros profissionais? É isso comum noutros profissionais? Qual é a abordagem por exemplo dos médicos aos doentes? Contam-lhes o que almoçaram ou assumem uma atitude séria para serem levados a sério? Porque é que é visto como uma piada os cirurgiões agirem desta forma (descontraída/relaxada) durante uma cirurgia? Será que o nosso trabalho não é sério, rigoroso e exige concentração? Penso que devemos adoptar uma "postura séria" perante os outros para sermos levados a sério, para valorizarmos o nosso trabalho e mantermos alguma autoridade. Se pensarmos bem, quem nos atende com extrema simpatia é quem mais nos quer enganar. Os vendedores, sobretudo os "da banha da cobra" são de uma extrema simpatia. Já abordei a questão da simpatia e suas consequências anteriormente, acabando este post por ser um complemento do mesmo, mas surgindo por razões diferentes. A nossa imagem social é em grande parte construída por nós mesmos e será do nosso maior interesse sermos levados a sério por toda a gente para que ninguém tenha dúvidas de quando estamos "a brincar" ou "a sério" e assim nos darem a importância que precisamos por vezes e merecemos sempre.

07 fevereiro, 2010

A outra face da inveja


...ser invejado. Porquê? Por incrível que pareça, por ser uma classe trabalhadora, por trabalhar em mais que um sítio, por trabalhar mais horas que as outras pessoas. Farto de tanto ouvir falar nas "acumulações dos enfermeiros" (sobretudo nestas alturas de greves e manifestações) e esclarecendo desde já que eu só trabalho num sítio, 40 horas semanais (não me importava nada de trabalhar só 35), vou expor aqui a cegueira induzida pela inveja de muitas pessoas. Eu trabalho só num sítio, não por falta de oportunidades, mas porque para mim é mais fácil poupar o dinheiro do que ganhá-lo, mas tenho vários colegas a acumularem funções em vários sítios. Porque têm esta tendência os enfermeiros? por quererem levar um nível de vida superior ao que o seu ordenado permite? Para exibir um status sócio-económico à altura daquilo que a sociedade projecta? Para a maioria das pessoas, os enfermeiros ganham muito dinheiro, pelo que o base de €1020 revelado nesta fase de luta foi uma grande surpresa para a maioria das pessoas. Porque "os colegas também fazem"? Não sei, mas poderia-se fazer um trabalho de investigação sobre o assunto (como eu já referi anteriormente, para os psicólogos, sociólogos ou semelhantes, não para os enfermeiros investigarem). Já agora, investiguem também porque gera tanta inveja que os enfermeiros se sujeitem a trabalhar tanto, se o esforço é deles, se não roubam nada a ninguém, se trabalhar não é nenhuma regalia. Antes de virem falar de atitudes diferentes no público/privado, lembrem-se que é exigido o mesmo nos dois sectores e toda a gente sabe como reclamar de maus profissionais/falta de profissionalismo. E aqueles que têm tanta inveja, porque não arranjam eles também um segundo ou terceiro emprego? Conheço enfermeiros a acumular funções no Lidl... a arrumar prateleiras durante a noite, a acumular funções como empregadas de limpeza... concorrem a estes lugares em igualdade de circunstâncias. E para os que se admirarem com isto, pensem bem: nestes cargos, conseguem ganhar tanto ou mais (actualmente) que a trabalhar como enfermeiros num privado e têm (muito) menos responsabilidades, menos riscos laborais, provavelmente menos esforço físico e sem dúvida menos esforço mental e nem o estatuto varia assim tanto actualmente. Só para terminar, refiro outra coisa "comichosa", que parecem ser as "horas extra que os enfermeiros ganham"; é preciso esclarecer as pessoas que estas horas implicam trabalho, implicam trabalhar mais do que o que seria previsto, significa abdicar de horas de descanso, horas com a família, planos previamente feitos... E se acham que o facto de serem remuneradas  a um valor superior compensa isto tudo, digo-lhes que no meu serviço ninguém quer horas extraordinárias, é sempre um sacrifício e na maioria das vezes é preciso sortear quem será o sacrificado. Talvez esses invejosos por aí espalhados queiram vir assegurá-las... depois de assegurarem um turno, acredito piamente que não voltariam a invejar tal sorte.
  
"Inveja-se a riqueza, mas não o trabalho com que ela se granjeia."

01 fevereiro, 2010

O fim do cuidar


...ter os horizontes curtos (ou demasiado longos). Como referido em posts anteriores, cá está a minha reflexão sobre os enfermeiros que tentam aproximar ao máximo a enfermagem da sua essência, ao cuidar, que neste post será sempre no seu sentido mais restrito (e mais histórico). Estes enfermeiros que me parece estarem maioritariamente nas escolas (fora da prestação de cuidados portanto), mas também fora delas querem tornar a enfermagem autónoma e distinta das outras optando por um campo de acção que actualmente não é "ocupado" por ninguém, o do cuidar. Pergunto eu: nesta "guerra territorial" na área da saúde a que assistimos actualmente em que cada profissão tenta ficar com os campos de acção que mais lhe convêm, "guerra" essa onde a enfermagem tem sido (inertemente) vítima da usurpação de muitas das suas funções por vários profissionais, desde os mais antigos (farmacêuticos) até recentemente criados (ou em vias disso) TAE's, mas não se ficando por aqui, porque é que este campo de acção não foi ainda cobiçado por ninguém? Por antecipação e perspicácia da enfermagem não foi de certeza! Vou referir o Maslow, que com a sua hierarquia das necessidades nos diz que o mais importante para as pessoas é a fisiologia (respiração, comida, sono, excreção...) - plano onde os enfermeiros desempenham um importante papel, mas onde facilmente podem ser substituídos (pelo menos em grande parte das tarefas). Em seguida, depois de satisfeitas estas, surge a necessidade de segurança (do corpo, da saúde), onde o médico desempenha um papel fundamental - foi pela falta de saúde que a pessoa recorreu à instituição de saúde e portanto só depois de restaurada a saúde (altura em que tem alta e vai embora) é que a pessoa se começa a preocupar com a auto-estima, a solução de problemas, o respeito dos outros, a moralidade, ausência de preconceitos, etc. e assim se compreende que o doente não se importe que o médico não respeite tanto estas últimas necessidades, uma vez que satisfaz outras necessidades mais importantes para eles no momento. Assim, os referidos enfermeiros pretendem actuar na área das necessidades menos importantes das pessoas (doentes), pelo que nunca lhes poderá ser dada grande importância na sociedade actual, em que mal se consegue satisfazer a necessidade de saúde das pessoas e se procura a rendibilidade e a utilidade, a cura, não sendo possível financiar a satisfação de necessidades de menor importância. Quando num futuro (distante) a necessidade básica de saúde for facilmente satisfeita, então aí fará todo o sentido apostar em profissionais especializados nas áreas da estima e realização pessoal, mas nessa altura alguém se antecipará com certeza aos enfermeiros. E assim termino a minha análise do cuidar, seu passado e futuro.