13 agosto, 2009

Trabalho de licenciado


... ouvir quase todos os dias o comentário: "eu não queria ser enfermeiro(a), eu sei que são precisos e ainda bem que há quem queira ser, mas eu não conseguia, é preciso gostar muito..."


Quais são as ilações que eu tiro destes comentários frequentes?


Porque é que as pessoas não querem ser enfermeiro(a)s? Se em tempos idos era por "falta de coragem para ver sangue ou picar pessoas", hoje é por "não terem coragem para tomar conta das pessoas dependentes, mudar-lhe a fralda, dar-lhe de comer, ser maltratado e responder com um sorriso". Os enfermeiros deixaram de ser "os das picas" para passarem a ser "os das fraldas" (ou outra coisa menos bonita, que não vou aqui dizer). A enfermagem passou a ser vista como uma profissão suja; que dignificação pode daqui advir para a imagem dos enfermeiros? De quem é a culpa desta mudança? Não será dos enfermeiros que começaram a achar que deviam ser menos tecnicistas (e até deixaram ir "as picas" para os farmacêuticos), para serem mais "humanistas" e se especializarem em técnicas como a "mudança da fralda" ou o "levar a comida á boca do velhinho"? Dos enfermeiros que pedem aos familiares para sair da enfermaria para "mudarem as fraldas"? Não ficarei surpreendido se/quando assistir ao aparecimento da "especialidade em mudança de fraldas" ou "mestrado em cuidados de higiene no chuveiro". Será isto o cerne da enfermagem? Será que é necessário um profissional licenciado para mudar uma fralda, levar a comida á boca ou levar ao chuveiro QUALQUER doente? Para terminar, porque é preciso gostar de ser enfermeiro para se ser "bom enfermeiro" e não é preciso gostar para se ser bom professor? Somos uma profissão baseada na ciência ou nos sentimentos?

5 comentários:

Sant'Iago disse...

Incisivo! e Directo!. Ali.

Blogger de Saúde disse...

Em primeiro lugar parabéns pelo blog, é novo e por este Post traz algo mais.

Toca em pontos verdadeiros e reais, quanto à última questão somos um profissão baseada em Ciência claro , mas que integra em si uma forte carga humanitária .

Só sendo ciência é que se torna necessário ser Licenciatura... Mas o sê-lo não invalida que se esqueçam do básico e que se ensina ( ou quero pensar que sim ) nas escolas de Enfermagem.

Tive uma Professora que me disse que o maior desafio que teve e tinha não era formar Bons Enfermeiros, mas fazer destes Boas Pessoas.

Bem desculpe os devaneios, já está adicionada aos Links do COgitare em Saúde

http://cogitare.forumenfermagem.org/

LProlog disse...

Benvindo Lifepassenger. Ao contrário da sua professora, e o que eu pretendo com este post é por em causa se um bom enfermeiro tem de ser boa pessoa ou imprimir uma forte carga humanitária no seu trabalho. Relembro uma célebre frase que diz que "não se deve misturar trabalho com amor" (ou qualquer outro sentimento), i.e., um bom profissional será isento nas suas funções, mas isto não acontece na enfermagem, onde se incentiva inclusive a trabalhar "com o coração". Gostava de estimular a reflexão dos colegas sobre este assunto. Será que enfermagem se pratica por caridade e amor? Então porque precisamos de "ser boas pessoas" e "trabalhar com o coração"? Será que não devíamos ser imparciais nas nossas funções? Será que misturar os nossos sentimentos com os dos doentes, sofrer com eles não será uma factor demasiado contributivo para o burnout a curto prazo? Será que a compaixão se pode embutir na ciência?

finalista disse...

hoje em dia qualquer imbecil é e pode ser enfermeiro. é evidente que não é de todo necessário ser-se uma "madre teresa" nem de perto nem de longe mas, ter um mínimo de bom senso e de humanidade acho não faria mal a ninguém, e há muito "boa gente" que não tem ou não aparenta ter essas características, e isto é valido tanto para estudantes como para professores, passando por enfermeiros no activo...é que não basta ser-se, como direi, "decente" para com os doentes, mas também entre nós próprios, entre equipa, entre enfermeiros e estudantes. e eu sei do que falo pois como estagiário, ja assisti e ja experimentei do pior, mas também do melhor.

Sant'Iago disse...

"hoje em dia qualquer imbecil é e pode ser enfermeiro"
Mas qualquer imbecil não é bom enfermeiro. Assim como na sua imbecilidade, qualquer bom enfermeiro se pode tornar imbecil com o tempo...